O entrave maior para o avanço da Educação é que todas as esferas de governo não cumprem a legislação

Os principais desafios do financiamento da educação pública no Brasil estão vinculados à necessidade de superação de problemas criados pelos próprios governantes, que não tratam a questão educacional com a prioridade necessária, o que leva ao descumprimento de normas legais criadas para estimular o desenvolvimento e melhorar a qualidade da educação.

Esta foi uma das afirmações de impacto feitas pelo professor Nicholas Davies na manhã de terça-feira (03.04), na palestra de abertura do curso “Financiamento e Custeio da Educação”, resultado da parceria entre o Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE/BA), o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia (TCM/BA) e suas respectivas Escolas de Contas. A programação do módulo I do curso continua nesta quarta-feira (4.04). O Módulo II será realizado nos dias 17 e 18 de abril.

Professor-doutor, graduado em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestre em Educação pela mesma Universidade e doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), Nicholas Davies ainda citou como entraves ao desenvolvimento da educação no Brasil, além do descumprimento da vinculação constitucional de impostos para a manutenção e desenvolvimento do ensino, ocorrências como as grandes perdas nos recursos vinculados provocadas pela inflação, o desvio de recursos da educação, a corrupção generalizada, a sonegação fiscal, a inexistência de controle social, a isenção fiscal para escolas privadas e filantrópicas, os subsídios às escolas privadas, o clientelismo, o peso da burocracia e a fiscalização deficiente por parte dos Tribunais de Contas.

Na avaliação de Nicholas Davies, o Tribunal de Contas da União (TCU) se manteve na inércia diante do fato de, por muito tempo, o governo federal ter descumprido as normas legais da vinculação dos recursos dos impostos para a educação, sem que os presidentes tivessem suas contas rejeitadas, embora esta penalidade esteja prevista na Constituição.

Com o auditório Conselheiro Lafayette Pondé completamente lotado, a palestra foi aberta com uma breve saudação da conselheira do TCE/BA, Carolina Matos Alves Costa, que, além de coordenadora do curso, é presidente da Comissão do Projeto de Monitoramento do Cumprimento das Metas do Plano Nacional de Educação (PNE).

MOBILIZAÇÃO

Ao iniciar sua palestra, Nicholas Davies discorreu sobre as formas de financiamento da educação no Brasil e também quais são os recursos e despesas vinculados à área, informações que classificou como óbvias, mas essenciais para que se possa entender os percalços que dificultam o desenvolvimento do setor educacional no País. Ele se mostrou pessimista quanto a uma solução de curto prazo para resolver os problemas enfrentados no campo educacional, por considerar que qualquer saída passa pela mudança de comportamento das autoridades constituídas, pelas instituições e, principalmente por uma ampla mobilização da sociedade brasileira, visando medidas que levem a uma diminuição das desigualdades sociais com melhor distribuição de renda.

“A população brasileira precisa tomar conhecimento da situação real para que possa pressionar os governos e as instituições, a exemplo dos Tribunais de Contas, a fim de que os responsáveis pela aplicação das normas legais cumpram o que determina a legislação, não apenas para a área da educação, mas também para outras essenciais como a saúde e o saneamento básico. O entrave maior para a Educação é que todas as esferas de governo não cumprem a legislação”, disse Nicholas Davies.

O professor fez severas críticas à postura dos governantes, da União, Estados e Municípios, que, segundo ele, cumprem de forma seletiva o que a legislação determina e seguem procurando formas de reduzir os recursos que deveriam ser destinados à educação. Um dos exemplos citados foi a prática de criação de impostos sob a forma de contribuição, como aconteceu com a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). Como não tem a denominação de imposto, os recursos arrecadados por meio das “contribuições” não entram no cálculo dos percentuais mínimos que devem ser destinados à Educação (25% da arrecadação de impostos de Estados e Municípios e 18% da União).

Em sua explanação, Nicholas Davies elencou cinco desafios que, se superados, podem acender a luz no fim do túnel sombrio e tortuoso do cenário da educação no País:

1. Garantir pelo menos que os governos apliquem realmente os recursos vinculados em manutenção e desenvolvimento do ensino.

2. Garantir que os órgãos fiscalizadores (Tribunais de Contas, sobretudo) adotem procedimentos corretos de cálculo pelo menos da receita e despesa legalmente devida em educação.

3. Sensibilizar o Judiciário e o Ministério Público para obrigar os governos a cumprirem as exigências legais do financiamento da educação.

4. Diminuir significativamente a desigualdade tributária entre regiões, estados e mesmo entre municípios de um mesmo Estado, condição fundamental para possibilitar uma educação de qualidade igual em todo o território nacional.

5. Incentivar a participação da sociedade e, em especial, dos educadores no controle social dos recursos da educação.

AGRADECIMENTOS

Após a palestra, o conselheiro-presidente do TCE/BA, Gildásio Penedo Filho, parabenizou o especialista e enalteceu o projeto desenvolvido pela Casa de Controle em prol do avanço na educação. “Parabenizo a sua palestra e aproveito para esclarecer que a sua presença traz tranquilidade aos que aqui estão. Este projeto, que é coordenado pela conselheira Carolina Costa, conta com a parceria entre o TCE e o TCM e suas Escolas de Contas é de grande importância para a sociedade porque avalia a qualidade do gasto. Precisamos manter as luzes sempre aclaradas sobre essa despesa pública. Todos sabemos que educação é a base de um país sério, de um Estado que efetivamente deseje alcançar espaços mais promissores na nossa atual conjuntura”, disse o presidente do TCE/BA.

Depois de agradecer ao palestrante, a conselheira Carolina Costa ressaltou a importância da conexão entre os cidadãos e as instituições para que o Plano Estadual de Educação atinja seus objetivos. “Acredito que no estágio em que se encontra o desenvolvimento dos nossos trabalhos, no qual se percebe uma consciência coletiva, vemos, de maneira mais clara, a conectividade existente entre os direitos sociais e o orçamento público. A percepção dessa ligação, tanto pela sociedade quanto pelas instituições, tem potencial para reduzir parte das desigualdades do nosso país”, disse a conselheira, que entregou ao professor Nicholas Davies o certificado de participação no evento e materiais institucionais da Casa de Controle.

A mesa da solenidade de abertura foi composta pelo presidente do TCE/BA, conselheiro Gildásio Penedo Filho, pelo presidente do TCM/BA, conselheiro Francisco Andrade Netto, conselheiros do TCE/BA Marcus Presídio (vice-presidente), Inaldo da Paixão Santos Araújo (corregedor), Pedro Henrique Lino, João Bonfim, procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC), Danilo Andrade, conselheiro e diretor da escola de Contas do TCM/BA, José Alfredo Rocha Dias.