Em janeiro de 2018, o Ministério Público Federal (MPF) na Paraíba, o Ministério Público da Paraíba (MPPB), o Ministério Público de Contas (MPC) e o Ministério Público do Trabalho (MPT)
emitiram recomendação conjunta a gestores municipais do estado para que se abstivessem de contratar, sem licitação, escritórios de advocacia para recebimento de valores complementares do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), pagos pela União. O dinheiro, conforme a recomendação, deve ser destinado exclusivamente à educação.
Em razão da impossibilidade constitucional de destinação desses recursos para outras finalidades públicas, conforme já decidido pelo Supremo Tribunal Federal, a recomendação também orienta as prefeituras a informarem, caso já tenham recebido os recursos complementares do Fundef, qual a destinação que lhes foi dada. Orienta também a providenciarem que todos os recursos recebidos ou a receber a esse título tenham sua aplicação vinculada a ações em educação, mediante conta específica a ser aberta para tal finalidade. O objetivo é recompor aos cofres públicos os valores que foram pagos a escritórios de advocacia com recursos do Fundef, a fim de garantir-lhes a vinculação constitucional e legal.
Em outubro de 2018, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça entendeu que não é possível reter honorários advocatícios em crédito Fundeb concedido por via judicial. Segundo o relator do recurso, ministro Og Fernandes, apenas norma constitucional de igual proporção autorizaria o uso de dinheiro atrelado ao fundo para outras finalidades que não a manutenção e o desenvolvimento do ensino fundamental e a valorização do magistério.
Conforme levantamento do 3º Ofício, órgão do MPF na capital que atua especificamente com o tema Educação, dos 37 municípios sob atribuição da unidade do MPF na capital que receberam a recomendação, apenas os municípios de Caaporã, Cabedelo, Conde, Cuité de Mamanguape, Gurinhém, Itabaiana, João Pessoa, Juripiranga, Lucena, Marcação, Mataraca, Mogeiro, Pedras de Fogo e Salgado de São Félix manifestaram-se no sentido de acatar a recomendação.
Apesar de terem sido reenviados ofícios às prefeituras pedindo respostas, ainda não indicaram expressamente se acatariam a recomendação os municípios de Alhandra, Baía da Traição, Bayeux, Caaporã, Caldas Brandão, Capim, Cruz do Espírito Santo, Curral de Cima, Itapororoca, Jacaraú, Juripiranga, Mamanguape, Mari, Mogeiro, Natuba, Pedras de Fogo, Pedro Régis, Pilar, Pitimbu, Riachão do Poço, Rio Tinto, Santa Rita, São Miguel de Taipu, São José dos Ramos, Sapé e Sobrado.
Ato recente – O mais recente ato do Inquérito Civil nº 1.24.000.002052/2017-80 que apura a questão foi a expedição de ofício ao Tribunal de Contas do Estado da Paraíba, solicitando que informe se, dentre o período de 17 de janeiro de 2018 até 6 de fevereiro de 2019, os municípios que indicaram expressamente se acatariam a recomendação utilizaram recursos do Fundef/Fundeb, recebidos por precatórios das ações ajuizadas, no pagamento de honorários contratuais advocatícios.
Dentre os municípios que responderam, a prefeitura do Conde informou a não contratação do escritório de advocacia e que não transitaram em julgado as demandas judiciais relativas às execuções; Guarabira afirmou que a Advocacia-Geral da União comunicou ofício informando que fora expedido precatório; João Pessoa recebeu os valores do Fundef e afirmou que não foram utilizados para pagamento de honorários advocatícios; Lucena afirmou ter contratado escritório de advocacia, mas informou que a prefeitura distratou o contrato de forma unilateral, habilitando seu procurador-geral na ação judicial; Marcação também havia contratado escritório de advocacia com finalidade de receber os valores do Fundef, mas afirmou que não efetuaria o pagamento dos advogados mediante as verbas recebidas; por fim, Pilõezinhos afirmou não ter firmado contrato com escritório de advocacia e que não havia recebido nenhum valor referente ao Fundef.
Os quatro ramos do Ministério Público (MPF, MPPB, MPC e MPT) aconselharam os municípios que buscassem suas respectivas procuradorias municipais para o recebimento dos precatórios referentes a diferenças da complementação federal do Fundef e que fossem depositados em conta reservada a este propósito, garantindo a rastreabilidade dos recursos, conforme determina o artigo 17 da Lei 11.494, de 20 de junho de 2007.
Entenda o caso – Os valores citados pela recomendação são decorrentes de diferenças da complementação federal do valor mínimo anual por aluno (VMAA), prevista na Lei do Fundef (Lei 9.424/96), pagas a menor pela União, quando houve a mudança do Fundo (de Fundef para Fundeb).
A jurisprudência das cortes federais passou a garantir o direito à complementação pleiteada, de modo que diversos municípios no Brasil contrataram escritórios de advocacia e ingressaram com ações de cobrança. Em 2015, o MPF também chegou a ajuizar ação civil pública em São Paulo, na qual a Justiça Federal sentenciou a União a repassar aos municípios lesados a diferença dos valores devidos.
Como consequência, diversos municípios contrataram escritórios de advocacia para ingressar com ações de cobrança contra a União e obtiveram quantias vultosas. No entanto, o pagamento dos honorários advocatícios não poderia ter sido vinculado a qualquer percentual dos recursos complementares do Fundef decorrentes dos atos judiciais produzidos para recebimento dos valores devidos pela União aos municípios cobradores.