O Supremo Tribunal Federal suspendeu os efeitos de diversos artigos da Lei de Responsabilidade Fiscal em razão da pandemia do coronavírus. Apesar de a LRF trazer alguns dispositivos que lhe dão alguma flexibilidade, como nos casos em que são decretados estados de emergência chancelados pelo parlamento, a lei foi basicamente feita para épocas de normalidade.
Como não estamos vivendo tempos normais, as cláusulas de escape ali previstas são insuficientes. Restam diversos outros mecanismos restritivos que iriam impedir ou pelo menos gerar uma enorme insegurança nos responsáveis pelas providências de gastos públicos.
Tais despesas não serão pequenas: além do gasto direto em saúde, as medidas para minimizar os impactos sociais e econômicos da pandemia serão substanciais, sem precedentes na história brasileira recente. É cedo para calcular o montante, mas não será surpresa se superar R$ 1 trilhão. De onde virá tanto dinheiro?
Basicamente, do aumento do endividamento público, uma vez que o governo federal tem capacidade quase ilimitada de gerar recursos por meio do banco central. É claro que as preocupações sobre esse tipo de política persistem. Não vai gerar inflação? Se é possível conseguir fundos ilimitados porque não se fez isso antes, para combater as tantas mazelas que o Brasil enfrenta? São indagações pertinentes e complexas, mas não há muita escolha no momento: a consequência de não seguir esse caminho é uma espiral ilimitada de mortes e uma economia em profunda depressão, com reflexos sociais alarmantes e imprevisíveis.
O conforto é que outros países estão empreendendo esforços semelhantes e que, em outras crises mundiais relevantes, esses expedientes foram fartamente utilizados com êxito. Na grande crise de 2008, por exemplo, tanto o banco central europeu quanto o Federal Reserve Bank americano atuaram fortemente nessa direção, fornecendo farta liquidez para a economia, o que foi decisivo para a superação daquela crise.
Obviamente que as exigências de transparência total sobre o que será gasto são imprescindíveis. Infelizmente, não falta quem queira aproveitar a situação para obter vantagens ilícitas. Por isso, a atuação dos órgãos de controle não pode ser descurada: uma atuação cooperativa, ciente do gravíssimo momento que estamos vivendo, que exige compreensão e boa vontade de todos, mas que não pode tolerar corrupção e desvios de conduta.
*Edilberto Carlos Pontes Lima, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE/CE)