Aprova a Nota Técnica nº 20/2020, que traz orientações gerais acerca da regulamentação, gestão e oferta de benefícios eventuais no contexto de enfrentamento aos impactos da pandemia da COVID-19, causada pelo novo coronavírus, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).
A SECRETÁRIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL do Ministério da Cidadania, no uso das atribuições que lhe confere a Portaria nº 115, de 20 de março de 2017, do então Ministério do Desenvolvimento Social, e com fundamento no Decreto nº 9.674, de 2 de janeiro de 2019, e
CONSIDERANDO o Decreto nº 6.307 de 14 de dezembro de 2007, que regulamenta os benefícios eventuais de que trata o art. 22 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS;
CONSIDERANDO as Orientações Técnicas sobre Benefícios Eventuais no SUAS, publicadas em formato digital pelo então Ministério do Desenvolvimento Social, em dezembro de 2018;
CONSIDERANDO a Declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional pela Organização Mundial da Saúde em 30 de janeiro de 2020, em decorrência da Infecção Humana pelo novo coronavírus (COVID-19);
CONSIDERANDO a Portaria/MS nº 188, de 4 de fevereiro de 2020, que declara Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), em decorrência da Infecção Humana pelo novo coronavírus (2019-nCoV);
CONSIDERANDO a Portaria/MC nº 337, de 24 de março de 2020, que dispõe sobre medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, COVID-19, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social;
CONSIDERANDO a Portaria nº 54, de 1º de abril de 2020, que aprova recomendações gerais aos gestores e trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) dos Estados, Municípios e do Distrito Federal com o objetivo de garantir a continuidade da oferta de serviços e atividades essenciais da Assistência Social, com medidas e condições que garantam a segurança e a saúde dos usuários e profissionais do SUAS;
CONSIDERANDO a Portaria Conjunta nº 1, de 2 de abril de 2020 que dispõe acerca da utilização de recursos do Cofinanciamento Federal no atendimento às demandas emergenciais de enfrentamento ao Coronavírus (Covid-19) no âmbito do Sistema Único de Assistência Social;
CONSIDERANDO o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, que reconhece, para os fins do art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a ocorrência do estado de calamidade pública;
CONSIDERANDO a disseminação do novo coronavírus (COVID-19) e sua classificação mundial como pandemia, e as medidas adotadas no âmbito de estados, municípios e do Distrito Federal para prevenir o espalhamento do vírus, reforçando-se a importância de o Poder Público garantir a oferta regular de ações socioassistenciais voltados, principalmente, à população mais vulnerável e em risco social e promover a integração necessária entre o Sistema Único de Assistência Social - SUAS e demais políticas públicas, resolve:
Art. 1º Aprovar, na forma do Anexo, a Nota Técnica nº 20/2020, que traz orientações gerais a gestores e trabalhadores do SUAS dos Estados, Municípios e do Distrito Federal acerca da regulamentação, gestão e oferta de benefícios eventuais no contexto de enfrentamento aos impactos da pandemia da COVID-19, causada pelo novo coronavírus, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social - SUAS.
Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS
ANEXO I
NOTA TÉCNICA Nº 20/2020
1. ASSUNTO
1.1 Orientações gerais a Estados, Municípios e Distrito Federal - DF acerca da regulamentação, gestão e oferta de benefícios eventuais no atendimento às demandas emergenciais de enfrentamento ao Coronavírus (Covid-19) no âmbito do Sistema Único de Assistência Social.
2. JUSTIFICATIVA
2.1 Esta Nota Técnica traz orientações a Estados, Municípios e DF acerca de parâmetros para regulamentação, gestão e oferta de benefícios eventuais do SUAS no contexto de enfrentamento dos impactos ligados à pandemia de COVID-19, em razão da publicação das portarias: a) Portaria MC nº 337, de 24 de março de 2020, que dispõe sobre medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, COVID-19, no âmbito do SUAS; b) Portaria nº 54, de 1º de abril de 2020, que aprova recomendações gerais para garantia da continuidade da oferta segura de serviços e atividades essenciais do SUAS; e, c) Portaria Conjunta nº 1, de 2 de abril de 2020 que dispõe acerca da utilização de recursos do Cofinanciamento Federal para o SUAS no atendimento às demandas emergenciais de enfrentamento à Covid-19.
2.2 As orientações da presente Nota Técnica visam detalhar recomendações sobre o processo de regulamentação ou aperfeiçoamento normativo local e oferta dos benefícios eventuais no contexto de calamidade decorrente da pandemia de COVID-19. Ainda traz aspectos relevantes para observação de gestores municipais, do DF e dos estados quanto à gestão, no que diz respeito ao financiamento e cofinanciamento de tais benefícios, respectivamente, considerando o disposto na LOAS quanto às competências dos entes federados.
3. INTRODUÇÃO
3.1 Inscritos no campo dos direitos socioassistenciais e integrantes do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, os benefícios assistenciais - entre eles os benefícios eventuais - são provisões públicas de caráter temporário que se destinam a indivíduos e famílias que não podem satisfazer suas necessidades básicas com recursos próprios.
3.2 Os benefícios eventuais são garantidos desde 1993 pela Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 - Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS. Eles estão dispostos em seu artigo 22, que prevê: "Art. 22. Entendem-se por benefícios eventuais as provisões suplementares e provisórias que integram organicamente as garantias do Suas e são prestadas aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).".
3.3. Em relação à definição de estado de calamidade pública, importa destacar que o regulamento dos benefícios eventuais, disposto no Decreto nº 6.307, de 14 de dezembro de 2007 define, em seu art. 8º, parágrafo único, que: "Art. 8o(...) Parágrafo único: (...) entende-se por estado de calamidade pública o reconhecimento pelo poder público de situação anormal, advinda de baixas ou altas temperaturas, tempestades, enchentes, inversão térmica, desabamentos, incêndios, epidemias, causando sérios danos à comunidade afetada, inclusive à incolumidade ou à vida de seus integrantes. (BRASIL, 2007)
3.4 Destaca-se que as epidemias podem acarretar o reconhecimento de estado de calamidade quando o Poder Público entende que as demandas impostas pela situação extrapolam sua capacidade de resposta.
3.5 Nesse sentido, as normativas federais identificam as calamidades públicas como situações que causam perdas, riscos e danos à integridade pessoal e familiar, razão pela qual demandam respostas imediatas do Poder Público como a prestação de benefícios eventuais.
4. BENEFÍCIOS EVENTUAIS NAS SITUAÇÕES DE CALAMIDADE E EMERGÊNCIA - ORIENTAÇÕES GERAIS
4.1 O Município tem a competência de regulamentar a oferta dos Benefícios Eventuais em âmbito local, mas se não há previsão normativa municipal sobre a oferta de Benefícios Eventuais especificamente para situações de calamidades e emergências é possível atender as demandas da população observando a normativa que prevê a oferta de benefícios eventuais para a situação de nascimento, morte ou vulnerabilidade temporária. Isso porque essas situações abrangem as mesmas necessidades advindas da situação de calamidade. Contudo, outra opção possível é a normatização de benefício eventual específico. O processo de regulamentação ou adequação normativa no contexto de calamidades e emergências será orientado nesse documento.
4.2 Seguem elementos importantes a se considerar na oferta de benefícios eventuais em situações de calamidades e emergências:
I - O benefício eventual deve ser concedido na forma de pecúnia e/ou bens de consumo, em caráter provisório.
II - Seu valor deve ser fixado de acordo com o grau de complexidade do atendimento de vulnerabilidade e risco pessoal das famílias e indivíduos atingidos e/ou afetados.
III - A oferta de benefícios eventuais em bens, na situação de calamidade em decorrência da pandemia da COVID-19, deve estar em conformidade com as necessidades e demandas dos requerentes e com a realidade local. Podem ser bens normalmente concedidos em situação de vulnerabilidade temporária, como o alimento, assegurando-se a qualidade do bem ofertado. Em termos de garantia de proteção social, é mais importante considerar a situação de vulnerabilidade vivenciada pelas pessoas, as ameaças e os riscos que se impõem do que a oferta de um ou de outro bem específico.
IV - Os benefícios devem ser ofertados de forma integrada com os serviços da política de Assistência Social, além dos programas, projetos e demais benefícios do SUAS, observando as regras dispostas na Portaria nº 337 do Ministério da Cidadania, de 24 de março de 2020, quanto às medidas e condições que garantam a segurança e a saúde dos usuários e profissionais do Sistema Único de Assistência Social-SUAS.
V - As provisões relativas a programas, projetos, serviços e benefícios diretamente vinculados ao campo da saúde, educação e das demais políticas setoriais não se incluem na modalidade de benefícios eventuais da assistência social (art. 9º do Decreto nº 6.307/2007; art. 1º da Resolução CNAS nº 39/2010).
VI - A equipe técnica responsável pela concessão de benefícios eventuais é quem deve avaliar a forma mais adequada da prestação do benefício, conforme regulamento local, assegurando sua integração às ações da rede socioassistencial e ações de outras políticas públicas, mediante articulação feita pela gestão local.
VII - O benefício eventual requer comprometimento orçamentário e qualificação técnica para sua prestação, devendo ocorrer preferencialmente no contexto do trabalho social com famílias no Sistema Único de Assistência Social (SUAS), respeitando-se o disposto na Portaria MC nº 337/2020 quanto ao cuidado e à prevenção da transmissão da COVID-19 na realização dos serviços socioassistenciais.
VIII - A provisão do benefício eventual deve ser ágil e garantida, realizada na perspectiva do direito e livre de qualquer atuação assistencialista ou de exigências que provoquem constrangimento aos usuários. Não podem ser exigidas contrapartidas para essa oferta e os critérios de acesso devem ser amplamente divulgados. Também são vedadas quaisquer formas complexas e vexatórias de comprovação de pobreza para a sua prestação.
IX - O objetivo da oferta de benefícios eventuais é assegurar a dignidade e a reconstrução da autonomia familiar e pessoal, respeitadas as responsabilidades fundamentais das políticas de Assistência Social, de Saúde, Segurança Pública, Defesa Civil, Habitação, entre outras. Isso significa que as políticas devem manter diálogo para o melhor atendimento aos cidadãos, evitando sobreposição ou lacuna de ações.
4.3 A situação de calamidade ocasionada pela pandemia da COVID-19 poderá fazer com que famílias e indivíduos atendidos precisem de um tempo maior que o previsto na norma sobre o prazo de duração da oferta do benefício para enfrentarem a vulnerabilidade vivenciada.
4.4 Assim, é importante que a regulamentação local considere possível a ampliação do prazo para recebimento do benefício eventual pelos usuários.
4.5 Da mesma forma, é importante que as equipes de trabalhadores do SUAS sejam orientadas para atuar com a possibilidade de ampliar o prazo da oferta, bem como para as maneiras de informar o público atendido sobre os prazos ampliados.
4.6 Cabe lembrar que os prazos adotados localmente na oferta de benefícios eventuais devem ser observados como uma referência e não como um impeditivo para a manutenção do benefício, já que eventos como a pandemia de COVID-19 podem trazer urgências e necessidades que demandarão prorrogação da data inicialmente indicada para o encerramento da concessão.
4.7 Com referência no que dispõe a Portaria nº 54 do Ministério da Cidadania, de 1º de abril de 2020, pode-se afirmar que, com o apoio da vigilância socioassistencial de âmbito local e demais políticas públicas, as equipes do SUAS precisam conhecer o território e a realidade da população que nele vive. O mapeamento, por exemplo, das áreas com pessoas vivendo de forma aglomerada em locais precários, áreas com presença de grupos em isolamento social, locais com maior incidência de violência, entre outros, permite agir proativamente na garantia dos benefícios eventuais.
4.8 Nesse sentido, é fundamental haver formalização de fluxos entre as gestões das políticas públicas locais para se trabalhar intersetorialmente. O trabalho intersetorial favorece o acesso direto a dados locais de políticas como Saúde, Educação, Segurança Pública, Segurança Alimentar, Habitação, Direitos Humanos, Defesa Civil, entre outras, contribuindo para que as ações executadas sejam mais efetivas no atendimento às necessidades da população.
5. BENEFÍCIOS EVENTUAIS NAS SITUAÇÕES DE MORTE
5.1 Os serviços relacionados aos sepultamentos não constituem atribuição específica da política pública de Assistência Social, conforme se observa nas diretrizes do SUAS e nas Orientações Técnicas sobre Benefícios Eventuais no SUAS.
5.2 A oferta que cabe ao campo da política de Assistência Social, no que diz respeito à morte, distingue-se do serviço local de sepultamento de pessoas por meio de concessões públicas. Assim, cabe à Assistência Social a oferta de benefício eventual por situação de morte apenas quando o serviço funerário não é garantido de forma gratuita pelo poder público e quando as famílias não possuem meios para garantir o sepultamento.
5.3 Além de necessidades específicas do funeral, como urna funerária e velório, as famílias podem apresentar outras vulnerabilidades geradas com a morte do familiar, que devem ser consideradas pela equipe no processo de concessão do benefício eventual.
5.4 O benefício eventual por situação de morte, também chamado de benefício eventual funeral (ou auxílio-funeral), pode ser ofertado em pecúnia, por uma única parcela ou mais, em bens de consumo, ou com a prestação de serviços. Admite-se ainda a oferta por meio de ressarcimento, no caso de perdas e danos causados pelo não acesso ao benefício eventual no momento em que ele se fez necessário.
5.5 As modalidades de oferta do benefício eventual por situação de morte, incluindo a previsão de oferta em contextos de calamidades e emergências, devem estar definidas na regulamentação municipal ou do DF, observando a Resolução do respectivo Conselho de Assistência Social.
5.6 Diante da possibilidade de que a situação de calamidade gere aumento expressivo no quantitativo de demandas pelo benefício eventual por morte, cabe ao poder público local a edição de normativas como o Decreto de Calamidade, que possibilita a ampliação de gastos. Vale destacar que o cofinanciamento estadual também pode ser garantido de forma mais célere a partir da deliberação do Conselho Estadual de Assistência Social e pactuação na Comissão Intergestores Bipartite - CIB, de critérios de partilha com essa finalidade com referência nas especificidades das regiões do respectivo estado.
6. REGULAMENTAÇÃO DOS BENEFÍCIOS EVENTUAIS
6.1 O Decreto nº 6.307/2007 regulamentou o texto previsto na LOAS desde o ano de 1993 quanto aos benefícios eventuais em situações de calamidade: "Art. 8º Para atendimento de vítimas de calamidade pública, poderá ser criado benefício eventual de modo a assegurar-lhes a sobrevivência e a reconstrução de sua autonomia, nos termos do § 2º do art. 22 da Lei nº 8.742, de 1993.".
6.2 Assim, desde 2007, os municípios já dispunham de fundamento legal para regulamentar benefícios eventuais no enfrentamento de situações de calamidade.
6.3 Contudo, ainda é possível que algum município não possua a regulamentação ou que a regulamentação existente esteja em desacordo com as atuais normativas do SUAS, prejudicando, inclusive, o recebimento de recursos do cofinanciamento estadual. Esse documento aborda algumas questões sobre o cofinanciamento estadual mais adiante.
6.4 Quando o município já possui o benefício eventual normatizado, mas a norma não responde da forma esperada à situação de calamidade e emergência em decorrência da COVID-19, os poderes locais deverão se articular de forma urgente para alterar a norma de forma a dar respostas eficazes às especificidades da pandemia em seu território. Essa norma poderá ser alterada para atender as especificidades da epidemia no território.
6.5 Cabe orientar o seguinte para duas situações distintas:
I - Benefícios Eventuais não estão regulamentados: |
Será necessário regulamentar os benefícios eventuais de forma bastante rápida. A norma elaborada deverá estar de acordo com as normativas e orientações do SUAS, e prever a oferta na situação de calamidade. |
O Município poderá editar um Decreto, observando as deliberações do Conselho Municipal de Assistência Social quanto aos critérios e prazos para acesso aos benefícios eventuais. |
Os prazos poderão seguir a referência de duração prevista para a situação de calamidade em decorrência da pandemia de COVID-19. Os critérios devem estar em conformidade com as diretrizes e princípios do SUAS. |
II - Regulamentação em desacordo com o SUAS |
A situação de calamidade provocada pela pandemia da COVID-19 tem proporções inéditas e exige tomada rápida de providências. Isso também exige que princípios e diretrizes do SUAS sejam respeitados. |
A regulamentação garante a oferta dos benefícios eventuais na lógica do direito, com critérios objetivos e transparentes a serem observados na concessão. |
Cessada a situação de calamidade, é importante que a gestão municipal atue em conjunto com o Conselho local e o Poder Legislativo para realizar a adequação normativa dos benefícios eventuais e inserir a legislação específica dentro da Lei Municipal do SUAS. |
6.6 Em complementaridade, é fundamental enfatizar os seguintes aspectos:
6.7 As normas locais devem, preferencialmente, não utilizar a referência a patamar de renda para acesso a estes benefícios, mas fixar a sua concessão de acordo com o caso concreto que se apresenta.
6.8 A respeito do exposto acima, vale retomar o que dispõe a Portaria MC nº 54/2020, no ponto "5.2. Quanto aos benefícios eventuais em situação de emergência e calamidade", item "b": "Durante uma calamidade, famílias em situação de vulnerabilidade podem ter sua condição agravada, ao tempo em que famílias que anteriormente não precisavam de suportes da Assistência Social podem passar a demandá-los, sendo importante assegurá-los localmente, de acordo com as demandas apresentadas ao SUAS.".
6.9 O poder público local deve conhecer as especificidades de povos e comunidades tradicionais e grupos específicos presentes em seu território e considerar as diversas formas de habitação utilizadas, por exemplo, por pessoas em situação de rua, pessoas desabrigadas devido a desastres ou outras situações conjunturais, de pessoas em situação de itinerância (como os acampamentos e barracas do povo Romani/ciganos, entre outros).
6.10 Neste sentido, a ausência de endereço fixo e permanente não deve ser impeditivo para acesso ao benefício eventual no contexto da epidemia da COVID-19.
6.11 As normativas nacionais sobre benefícios eventuais dispõem que qualquer indivíduo ou família pode ter acesso a todas as modalidades deste benefício, atendidos os critérios definidos pela gestão local.
6.12 Dessa forma, qualquer pessoa, nacional ou estrangeira, que esteja no território brasileiro e vivencie situação de risco e dificuldades para sua manutenção e de sua família deve ter acesso à política de Assistência Social para garantir a sobrevivência de seus membros.
7. LOCAIS DE OFERTA
7.1 O poder público local possui autonomia para definir onde será feita a concessão dos benefícios eventuais, devendo observar as deliberações do Conselho de Assistência Social local e a realidade das famílias em seus territórios.
7.2 O local de prestação dos benefícios eventuais deve ser amplamente divulgado, para que as pessoas não tenham dúvida sobre o lugar para onde devem se dirigir no momento da necessidade. Deve ser garantido o fácil acesso e o atendimento digno da população demandante. O local de prestação pode ser definido em Portaria Municipal ou do DF, considerando as especificidades da situação.
7.3 A oferta de benefícios eventuais deve ocorrer, preferencialmente, no contexto do trabalho social com famílias desenvolvido no âmbito dos serviços socioassistenciais, resguardadas as determinações da Portaria nº 377 do Ministério da Cidadania, de 24 de março de 2020 quanto à adoção de medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do novo coronavírus.
7.4 No âmbito do trabalho social com famílias, a oferta ou concessão NÃO é simplesmente a disponibilização do benefício eventual, mas sim o ato formal de reconhecimento do direito ao benefício. É uma ação que deve ocorrer por meio de escuta qualificada, verificação do atendimento de critérios definidos em regulamentação local e registro em instrumento utilizado nas unidades ofertantes. Deve ser realizada preferencialmente por técnicas e técnicos de nível superior das equipes de referência do SUAS, conforme regulamentação local.
7.5 Não é necessário instrumental privativo de uma profissão, como o parecer social, para justificar a concessão do benefício eventual.
7.6 Os benefícios eventuais são provisões de oferta obrigatória nos municípios e DF no âmbito do SUAS, portanto, reforçando as recomendações da Portaria MC nº 54/2020, a gestão local de Assistência Social deve planejar-se para garantir a disponibilização desses benefícios a quem necessitar.
7.7 É princípio dos benefícios eventuais a oferta feita com agilidade e presteza, tendo em vista o atendimento de situação emergencial. Neste sentido, não deve haver filas de espera ou ofertas condicionadas à realização de visitas domiciliares, o que pode se configurar como obstáculo para o acesso ao direito.
7.8 As visitas domiciliares são importantes estratégias de trabalho, utilizadas, em geral, no processo de reavaliação da concessão de benefícios eventuais já ofertados durante determinado período. No contexto da pandemia da COVID-19, conforme recomendações da Portaria MC nº 54/2020, as visitas domiciliares devem ser realizadas apenas em situações indispensáveis, com obrigatória observação de medidas para a proteção e segurança dos trabalhadores e dos usuários.
8. COMPETÊNCIAS DOS ENTES FEDERADOS
8.1 De acordo com a LOAS os entes federados possuem atribuições distintas em relação aos benefícios eventuais.
8.2 Isto foi especificamente tratado nos dispositivos acerca das competências da União, dos estados, dos municípios e do DF, conforme se vê no quadro a seguir:
UNIÃO |
ESTADOS |
MUNICÍPIOS E DF |
Tem a atribuição legal de definir e elaborar normas gerais, orientar e assessorar estados e municípios acerca de benefícios eventuais. A Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS não define como de competência da esfera federal o repasse de recurso financeiro para participação no custeio da oferta de benefícios eventuais. |
Compete aos Estados prestar apoio técnico e destinar recursos financeiros aos municípios para participar no custeio da oferta dos benefícios eventuais, a título de cofinanciamento. |
São os responsáveis por destinar recursos financeiros para custeio do pagamento dos benefícios eventuais, além de regulamentar tais benefícios e organizar sua oferta. |
FUNDAMENTO LEGAL: |
Art. 12 da LOAS. |
Art. 13 da LOAS, inciso I. |
Art. 14, inciso I; Art. 15, inciso I. |
8.3 IMPORTANTE observar que conforme disposto na Portaria MC nº 1/2020, os recursos federais associados ao IGD-SUAS não podem ser utilizados em despesas relativas a ofertas realizadas diretamente aos beneficiários, como os benefícios eventuais.
8.4 A Portaria Conjunta nº 1/2020 da Secretaria de Gestão de Fundos e Transferências e da Secretaria Nacional de Assistência Social do Ministério da Cidadania, de 2 de abril de 2020, também trouxe o entendimento de que os recursos de cofinanciamento federal, principalmente dos saldos, poderão ser utilizados nas ações de combate à pandemia em qualquer circunstância, desde que as "obrigações específicas dos estados e municípios com as despesas caracterizadas como benefícios eventuais" sejam respeitadas. Tais obrigações são aquelas presentes no quadro anterior. Seguem, abaixo, detalhamentos específicos.
8.5 Cofinanciamento estadual:
8.6 A participação no custeio dos benefícios eventuais é competência do ente estadual, definida na LOAS em seu artigo 12, e trata-se de uma importante estratégia de cofinanciamento dos benefícios eventuais ofertados nos municípios.
8.7 A Resolução da Comissão Intergestores Tripartite - CIT nº 01, de 22 de fevereiro de 2017 (Pacto de Aprimoramento estadual), dispõe que constitui prioridade para os estados a universalização do SUAS com as metas de cofinanciar os benefícios eventuais priorizando os municípios que tiverem a Lei Municipal do SUAS instituída.
8.8 Ressalta-se que no contexto da situação de calamidade decorrente da pandemia da COVID-19, a simples existência de regulamentação dos benefícios eventuais poderá ser condição suficiente para a efetivação do cofinanciamento estadual, não havendo necessidade de vinculação à Lei Municipal do SUAS.
8.9 Observando a previsão legal, os municípios podem ainda solicitar cofinanciamento estadual para benefício eventual, caso não tenham, e pedir agilidade no processo de normatização do cofinanciamento pelo estado, considerando o reconhecimento de situação de calamidade em decorrência da COVID-19.
8.10 Financiamento municipal
8.11 Foi reconhecido estado de calamidade pública nacional pelo Decreto nº 06, de 20 de março de 2020, com efeitos até 31 de dezembro de 2020. Este reconhecimento permite que a União seja dispensada de atingir os resultados fiscais e o limite de empenho previstos no art. 9º da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal-LRF) com vistas investir na execução de políticas públicas necessárias ao enfrentamento da pandemia.
8.12 Em consonância com o governo federal, os governos municipais podem, diante de reconhecimento de calamidade pública municipal, analisar a viabilidade de se adotar o mesmo mecanismo para ampliar, neste caso, o financiamento de benefícios eventuais.
8.13 Vale destacar que em 29 de março de 2020, o Supremo Tribunal Federa - STF concedeu Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.357 - Distrito Federal "para, durante a emergência em Saúde Pública de importância nacional e o estado de calamidade pública decorrente de COVID-19, afastar a exigência de demonstração de adequação e compensação orçamentárias em relação à criação/expansão de programas públicos destinados ao enfrentamento do contexto de calamidade gerado pela disseminação de COVID-19".
8.14 A Medida Cautelar se aplica a estados e municípios que, "nos termos constitucionais e legais, tenham decretado estado de calamidade pública decorrente da pandemia de COVID-19".
8.15 A legislação orçamentária abre excepcionalidades para as situações de emergência e calamidade pública. Conforme dispõe o art. 24, inciso IV da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, é dispensável a licitação: "IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos.".
8.16 O reconhecimento de calamidade pública permite que o Poder Executivo gaste mais do que o previsto na Lei Orçamentária Anual - LOA para custear ações de combate à pandemia.
8.17 Neste sentido, ao se decretar situação de calamidade pública no município o ente público dispõe de mais possibilidades de utilização dos recursos já previstos para benefício eventual, podendo dar respostas rápidas às demandas que vão surgindo durante a pandemia do COVID-19.
8.18 Os recursos para financiamento de benefícios eventuais devem estar previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) municipal e do DF, conforme dispõe o § 1º do art. 22 da LOAS, e alocados no respectivo Fundo de Assistência Social.
8.19 O orçamento deve ser elaborado com base no planejamento local, com previsão de despesas a partir da identificação da receita, considerando o território e a situação das famílias que nele vivem. Também deverá ter como base a Lei Municipal do SUAS no que se refere aos benefícios eventuais regulamentados no município.
8.20 Contudo, a Portaria Conjunta nº 1/2020 (item 3.3 da Nota Técnica Conjunta SNAS/SGFT nº 1/2020) registra que: "(...) em situação emergencial, de calamidade pública, as regras da execução são flexibilizadas. O próprio Decreto que estabeleceu o estado de calamidade deverá ser utilizado como justificativa para as aquisições não previstas nos instrumentos de planejamento, os quais com exceção da Lei Orçamentária Anual - LOA, serão ajustadas ao seu tempo.".
9. VEDAÇÕES EM ANO ELEITORAL
9.1 Em relação às vedações em ano eleitoral, a Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, que estabelece normas para as eleições (Lei das Eleições), dispõe em seu artigo 73, § 10 que: "Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: (...) § 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006).".
9.2 A Lei veda práticas eleitoreiras, como a distribuição gratuita de itens não regulamentados, que ocorrem quando o(a) gestor(a) ou o(a) prefeito(a) utiliza de forma personalista os recursos públicos para a obtenção de apoio político.
9.3 Contudo, como os benefícios eventuais estão inscritos no campo do direito, compondo as garantias do SUAS, não estão abrangidos pela vedação do período eleitoral.
9.4 A previsão normativa municipal que estabelece a oferta de Benefícios Eventuais com critérios objetivos e transparentes, deliberados pelos Conselhos locais de Assistência Social, garante uma oferta realizada no campo do direito.
9.5 O ato formal de oferta de benefícios eventuais é diferente de uma doação. No âmbito do trabalho social com famílias no SUAS, a oferta ou concessão envolve o processo de análise e reconhecimento do direito ao benefício eventual feito por profissionais da rede socioassistencial conforme regulamentação local.
DIREITO |
DOAÇÃO |
No âmbito da política pública de Assistência Social, toda oferta deve ocorrer na perspectiva do direito.
A proteção social é garantida aos cidadãos e cidadãs por meios legais e critérios normativos - conhecidos e reclamáveis - que estão em consonância com a Política Nacional de Assistência Social - PNAS. |
A doação é um ato de solidariedade caracterizado por ações voluntárias e de caridade, sem necessariamente contar com um parâmetro para sua realização. |
A LOAS é a norma de referência da política pública da Assistência Social e não prevê ofertas em caráter de doação. Assim como o SUAS não prevê qualquer ação na esfera dos entes federados e da gestão relacionada à doação de bens ou valores. |
10. CONCLUSÃO
10.1 A declaração, pelo Ministério da Saúde, de situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional - ESPIN devido à pandemia de COVID-19 pelo novo coronavírus (Portaria nº 188, de 3 de fevereiro de 2020) exige que gestores e trabalhadores do SUAS de todas as esferas envidem esforços para a realização de ações de prevenção e enfrentamento, visando evitar o agravamento das situações de vulnerabilidade vivenciadas pelo público usuário da SUAS.
10.2 Diante disso, recomenda-se a observância das orientações desta Nota Técnica para a adequada regulamentação local dos benefícios eventuais, a qualificação da oferta à população e a facilitação do processo de cofinanciamento estadual.